“O século XXI será religioso, ou simplesmente não será!”
(Frase atribuída a André Malraux)
Introdução.
O presente trabalho pretende refletir sobre os rumos da teologia cristã na
contemporaneidade e em suas perspectivas para o presente século. Não se propõe uma reflexão exaustiva, porém um breve olhar sobre as possibilidades e características da teologia em diálogo com o mundo. O título se refere ao problema a ser elucidado, cuja resposta, um tanto tímida, se insinua ao término da reflexão. As bases teóricas se encontram nas referências e alusões contidas no escrito.
Século XXI – Uma possibilidade para a teologia cristã?
A frase em epígrafe é comumente atribuída a André Malraux (1901-1976), literato francês. Ela reflete sobre a configuração de um mundo que, na contramão dos prognósticos do projeto do Iluminismo, parece conceder cada vez mais espaço para múltiplas expressões de religiosidade.
Por paradoxal que seja, é natural que o ser humano, definido por Aristóteles (c. 385-322 a.C.) como “animal racional” (gr. antropos tou zoon logikon), possa também ser reconhecido como homo religiosus, conforme o faz Mircea Eliade (1907-1986), historiador das religiões e mitólogo. De acordo com o guia elaborado pelos pesquisadores do “Real Instituto de Antropologia […]”, a antropologia admite desconhecer qualquer povo, daqueles até hoje estudados, que não tivessem alguma expressão de religiosidade (1971, p. 222), essa constatação, unida a outros fatores, levou à conclusão lógica expressa por Erich Fromm (1977, p. 137): “A necessidade religiosa é parte integrante das condições básicas da existência da espécie humana”.
Agora, em pleno alvorecer do século XXI vislumbra-se a expressão vigorosa da religiosidade, tanto no âmbito das religiões organizadas, como o Islamismo e o cristianismo evangélico e pentecostal, quanto em formas alternativas de espiritualidade; até mesmo personalidades conhecidas por suas críticas às religiões, céticos, agnósticos e até ateus têm procurado um veículo de expressão de seu sentimento religioso, naquilo que tem sido identificado como “espiritualidade para ateus” [1].
Qual será o espaço do cristianismo na contemporaneidade? E, qual o papel da teologia cristã para que alcance esse espaço?
O cristianismo tem como missão o anúncio do evangelho, enquanto resposta aos corações sedentos de sentido e significação! Mas, tem como desafio anunciar a um mundo, que desde o advento da Modernidade, se torna cada vez mais secularizado.
Essa secularização pode ser definida ao modo do Cardeal Marty (1970, p. 7): “A secularização se apresenta como uma fria aceitação da condição histórica do homem e das tarefas do nosso tempo, abstraindo-se da religião.”
O secularismo sustenta o moderno ateísmo, e, se funda nos princípios do antropocentrismo e do racionalismo.
A teologia cristã terá, então, que se haver com estes dois princípios, demonstrando a capacidade em falar sobre Deus sem escamotear o problema do humano e concomitantemente pregar a mensagem da fé, sem deixar de preencher os requisitos da racionalidade.
As tentativas levadas em efeito pelas escolas teológicas, calcadas no liberalismo, em diálogo com o mundo moderno, resultaram catastróficas para o cristianismo histórico, considerando, sobretudo, os casos mais extremos, tais como: o movimento da morte de Deus (Paul Van Buren) e a proposta do cristianismo sem religião (Bonhoeffer).
Estas escolas teológicas minaram as forças de muitas igrejas históricas e puseram em desconfiança da teologia, muitas igrejas evangélicas, sobretudo de confissão pentecostal[2].
Qual o possível caminho para que a teologia fale ao homem contemporâneo, sem perder sua identidade legitimamente cristã?
Para aqueles que estão familiarizados com a Bíblia e com a história da igreja cristã, admite-se não haver uma resposta nova, apenas aquela já conhecida do cristianismo histórico, que segue uma tradição desde os apóstolos, passando pelos padres e reafirmada pelos reformadores.
A teologia cristã há de ser cristocêntrica, ela necessita urgentemente reconhecer que falar sobre o humano, caído ou (e) regenerado, exige ter Cristo como ‘pedra de toque’. A teologia há de ter na cristologia o seu centro, uma cristologia equilibrada e saudável, somente em torno de uma cristologia com essas características é que deve gravitar a antropologia teológica.
O apóstolo Paulo, por exemplo, iluminou a compreensão cristã acerca do homem, em passagens memoráveis, onde fala de Cristo[3].
Como falar sobre a verdadeira essência do ser humano? Jüngel (1977, pp. 254-255) sintetiza a visão cristã sobre o humano.
A verdadeira essência do homem é sua correspondência (possibilitada por uma palavra que lhe fala) ao movimento pelo qual Deus, em Jesus Cristo, desceu até o homem. Esse movimento para baixo, para o homem, impede a este a subida à divindade. Assim como Deus se manifestou como Senhor no abaixamento, assim, também só na participação desse abaixamento que a imagem de Deus chegará à “glória dos filhos de Deus” (Rom. 8, 21)
Concluímos, pois junto a Barth (1954, p. 60, tradução nossa) em que “[…] nesta pessoa única vive e palpita toda a obra de Deus, e, todo aquele que diz “Deus”, no sentido em que o diz a Bíblia, haverá de dizer necessariamente e sem exceção: Jesus Cristo”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
BARTH, Karl. Bosquejo de Dogmatica. Tradução do texto alemão por M. Gutierrez-Marin. Argentina: Editorial La Aurora y Casa Unida de Publicaciones, 1954.
ELIADE, Mircea. O Sagrado e o Profano: A essência das religiões. Tradução de Rogério Fernandes. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
FROMM, Erich. Ser ou Ter? Tradução de Nathanael C. Caixeiro. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1977.
Guia Prático de Antropologia. Real Instituto de Antropologia da Grã-Bretanha e da Irlanda. Traduzido por Octavio Mendes Cajano. São Paulo, Editora Cultrix, 1971.
JÜNGEL, E. O Homem que Corresponde a Deus. IN: GADAMER, H. G.; VOGLER, P. Nova Antropologia: O Homem Em Sua Existência Biológica, Social e Cultural. Volume 6. São Paulo: EPU, Editora da Universidade de São Paulo, 1977
MARTY, François (Org.) Ateísmo e Secularização. Novas Fronteiras. Caxias do Sul – RS. Edições Paulinas. Volume 3. p. 7-11. 1970.
Shlesinger, Dr. Hugo; PORTO, Pe. Humberto. As Religiões Ontem e Hoje. São Paulo: Edições Paulinas, 1982.
[1]Para este tópico recomenda-se a leitura de “O Espírito do Ateísmo”, de André Comte-Sponville, “God On Your Own” (Deus do Seu Jeito, tradução livre), de Joseph Dispenza, “Living Without God” (Vivendo Sem Deus, tradução livre) e “Waking Up” (Despertando, tradução livre), de Sam Harris. Todas estas obras propõem a espiritualidade para ateus.
[2] A forte ênfase no culto emocional e nas experiências religiosas particulares dos fiéis pode ser interpretada como sintomas do afastamento da teologia, decorrente dessa desconfiança.
[3] Vide, por exemplo, I Cor. 15,45; 15, 20; Col. 1,18 e At. 26, 23.
Prezado Rev. fico feliz em ser um dos seguidores desse Site tao abencoador e importante para meus estudos, afirmo que sou aposentado e gosto de ler bons livros, peco desculpas em lhe ocupar nesse pedido, se o Sr. Rev. tem um livro de teologia que fale sobre a Historia dos Hebreus ou outro qualquer poderia enviar para meu endereco, ficarei agradecido e feliz, favor enviar p/meu End. no RN,na RUa.Baia de MAdureira, 16. Novga Partnamriim, Cidade de PArnamriim/RN. CEP. 59153-010. CPF.08871140400
que Deus lhe abencoe meu Rev. amem, abracos. JONAN
Prezado, Sr. Jonan Gregório da Silva.
Agradeço a apreciação aos nossos escritos.
Quanto ao seu pedido, irei considerá-lo com carinho! Farei um breve levantamento de qual obra posso disponibilizar, posto que a maioria me é de grande importância. Mas adianto que ficarei feliz em poder atendê-lo de alguma forma.
Um abraço afetuoso!
Carlos E. Bernardo
Bueníssima reflexão!
Particularmente simpatizo bastante com a noção de um “cristianismo sem religião” de Dietrich Bonhoeffer.
É minha impressão, de leigo interessado, que a institucionalização do cristianismo prestou serviços e desserviços à Causa de Jesus Cristo. Em uma sociedade menos secularizada os serviços podem ter encoberto os desserviços. Contudo, em uma sociedade secularizada, com maior acesso ao conhecimento e a crítica, os desserviços se notabilizam mais. E me parece ser justamente o problema hoje.
É inegável a centralidade senhoria e da possibilidade salvífica em Cristo, mas, a instituição igreja por meio de seus “representante” salvo exceções, quiçá raras, foram que mais prejudicaram a divulgação das Boas Novas.
Mas, essa é só a minha opinião 🙂
Grato, Sr. Ronaldo.
É bom estar aberto à outras reflexões e atento ao que o Espírito nos tem a falado.
Um abraço afetuoso!
Carlos E. Bernardo
Amado amigo Carlos Eduardo Bernado!
Boa Tarde!
Agradeço por lembrar de mim amado com este texto maravilhoso.
Como sempre, um pensador nato!
Date: Tue, 31 May 2016 15:18:33 +0000
To: flaviodaval@hotmail.com
Grato, grande amigo, Flávio Dias.
Saudades de nossa “troca de figurinhas” teológicas, precisamos retomar nosso contacto. Estou em época de encerramento de bimestre,supercorrido, mas está chegando o período de férias, e, gostaria de encontrá-lo. Será uma alegria poder dialogar contigo.
Um abraço afetuoso!
Carlos E. Bernardo